Convido-lhes, caros leitores, a mais uma vez viajarmos pelas
belíssimas paisagens da Terra-Média. Ignoremos por alguns minutos – enquanto
lemos essa resenha ao menos – que a locação do set foi a Nova Zelândia e
embarquemos nesse mundo proposto por Peter Jackson, embasado na obra
incontestável de Tolkien, para analisarmos o filme como um todo e tecermos os
comentários pertinentes a respeito de O Hobbit – A Desolação de Smaug. Para o quesito
de facilidade de nomenclatura chamaremos o filme pela sigla de HDS, okay?Pode
ler que não haverá spoilers sobre a obra nesse review, sendo que posteriormente
lançaremos uma análise sobre o caminho tomado pela obra. Caso veja que não há
opção de não falar de algo que possa comprometer em algum nível alguma surpresa
você será avisado, então leia tranquilo. Claro, que se você não quiser saber
NADA antes do filme, bem, então pra quê ler uma análise? Bora lá?
Para inicio de conversa há uma pausa na campanha empreendida
pelos anões. Na primeira parte da trilogia de O Hobbit havíamos sido deixados
após a perseguição dos Orcs e Wargs. O final do primeiro filme estava galgando
um grau de ação sequencial e ascendente que imaginávamos se o novo filme começaria
no mesmo nível. Não. Somos levados em um
flashback para Bri, aquele lugar onde não é fácil fazer amigos, onde Thorin
Escudo-de-Carvalho conheceu Gandalf e esse lhe explica e lhe incumbe a missão
que culminaria naquela belíssima sequência de jantar/ reunião dos Dwarfs na
casa de Bilbo. Na taberna somos colocados a par de muitas coisas que não sabíamos
no primeiro filme, inclusive o motivo que encadeou a decisão do líder de seu povo a voltar a Erebor e uma parte confusa sobre Thrain.
O HDS é um filme primorosamente bem cuidado no quesito de
cenografia e figurinos nos teleportando sem muito esforço para a terra
fervilhada da mente de Tolkien. Mesmo sendo uma parte da saga onde partes
bonitas como o Condado ou a Toca das Águias não sejam mais recorrentes, muitos
cenários continuam de prender o fôlego. Lugares novos como as terras dos homens
foram bem retratadas, embora seja muito forte o lado político urbano que Jackson
explicitou nela. Porém isso é algo que realmente é pincelado no livro, só que
quando ganhou um quadro visual pareceu algo mais pungente. Há muitos mendigos,
as casas são aglomerados sobre tablados sobre a água e há muitos comentários
que lembram muito países subdesenvolvidos. Deu um tom real pra coisa toda. O único cenário que eu
particularmente não achei condizente com o restante foi a Floresta das Trevas.
Tanto que quando Bilbo espia por sobre as árvores e vemos aquelas imagens
acachapadas pelo sol dá um alivio muito grande. Talvez fosse essa a ideia do
diretor, de criar algo abafadamente psicológico, mas não agradou muito não. Nem
mesmo o grandioso refúgio élfico me agradou. Parecia tão longe do orgulho do
povo de orelhas pontudas.
Quanto ao enredo temos um filme que na visão macro é
fidedigna e nos detalhes deixa um pouco a desejar. Muitos atores acabam por
novamente diluir o aprofundamento nos carismáticos personagens principais e o
foco acaba pairando mais do que devia no par romântico que faria até Sauron -
que tudo vê – fechar os olhos um pouco. Tanto que os personagens principais
parecem ser Bilbo, Gandalf e o casal. Mesmo assim alguns anões que na película anterior
passaram batidos nessa edição tiveram uma personalidade melhor trabalhada, mas
algo que apenas o diferenciava dos demais. Mais ou menos assim: O Bombur é gordo
e preguiçoso, mas no máximo uma cena reforça isso e partimos pra outro. Espero
que no terceiro isso se resolva. Caso contrário a maioria das pessoas só
lembrará de Thorin, Balin (que estava muito carismático novamente, anão com cara de anão, sabe como é?) e os irmãos modelos. Ficou um pouco estranho. Mas já
voltaremos a isso. O filme me pareceu um
pouco mais longo do que poderia sustentar uma diversão sem olhar para o
relógio. Isso se deve muito a falta de
cenas épicas e musicais que permearam o primeiro filme. Muita pressão sobre
Peter Jackson – Por mais que os filmes
tenham sido gravados juntos em 2011 muito material foi adicionado nas partes
dos elfos – interferiram para que se desse um apelo mais formal para a
franquia com menos cenas de alívio cômico.
O engraçado é que
justamente o que foi deixado de lado do primeiro para o segundo filme são as
partes que mais deram certo. Peter Jackson havia declarado que HDS seria mais
sério e com menos apelo cômico, só que o filme tem suas partes mais brilhantes
em raríssimas cenas onde justamente prevalece o bom senso de humor. A parte dos
barris ao meu ver, excluindo as cenas com o dragão, é a sequência mais legal e
memorável do filme. Participam dela os anões, orcs e elfos, com a participação
milionária de Legolas. Acho que para o filme emplacar como sucesso absoluto – nada
nunca é, mas... – ele deveria ter explorado novamente as belas canções dos anões,
não há uma música memorável que seja, torná-lo mais épico, a falta de cenas
assim comprometeu em muito o saldo final já que em boa parte do filme ele fica
temperando os telespectadores em banho Maria (tanto que já citei, mas reforço
que a parte dos barris e de Smaug são as únicas partes que contém esses elementos fortes)
e ter esquecido as ideias revolucionárias de roteiro como a do embate final
entre os anões e Smaug. Não digo que a película devesse ser igualzinha ao livro
(isso é coisa de nerd chato), mas algumas cenas modificaram a essência dos
personagens. Aliás a crítica do primeiro
filme onde personagens como Bilbo e os anões ganham cenas de heroísmo
onde na essência deles havia só sucessos aleatoriamente confusos e atrapalhados
continua. Lembram quando o hobbit no
primeiro filme rouba o triunfo que originalmente era de Gandalf? Bom, nessa edição foi
extrapolado na conta dos anões. Porém o filme conta daquele jeito único de
Peter Jackson de contar histórias da Terra-Média. E atualmente ninguém melhor
que ele para contar histórias de lá. Tanto que ele cisma em fazer apostas altas
como o retorno do elfo mais amado da trilogia cinematográfica original.
Aliás, Legolas era uma preocupação. Todos estavam com medo
de ser apenas um personagem caça-audiência (e claro que foi, mas a questão não
é essa) tanto que até o Orlando Bloom explicou que pensou muito sobre sua
participação deixando claro que PJ o convenceu de que seria dada uma explicação
razoável e de fato sua participação no geral não estraga a jornada, com a única
exceção (esse filme é feito de muitas delas) do triangulo amoroso. Deixemos
isso para depois, ainda estamos falando das coisas boas. O elfo trouxe um algo
a mais pro filme, embora desnecessário, o chamado encher linguiça, mas a
referência a Gimli é algo genial. Vale pelo link para a trilogia da Sociedade
do Anel. As cenas de embate dele são bem sincronizadas, o que não era de
esperar por menos já que essa é uma das marcas do personagem, além do
estereótipo montado nos filmes. E não foram apenas dois minutos como todos
disseram não. Pode contar com pelo menos dez minutos de cabelos loiros
esvoaçando pelo grande ecrã. Foi a participação discreta e necessária que um
personagem inexistente na trama deveria ter. Já a Kate... Enfim, depois...
Bilbo, Martin Freeman, continua sendo caricato, mas dessa vez com uma
encenação mais discreta. O humor do único hobbit em cena destoa do pastelão dos anões. . E isso
é perfeito. Creio que por mais que os três filmes tenham sido gravado em uma
tacada só o ator está bem mais solto e convence muito bem na pele do pequeno ser do Condado. Não tem jeito, é nítido o humor inglês em suas
caras e bocas. Você certamente rirá com a cena de Bilbo e Smaug na pilha
infinita de moedas. Lembre-se dessa análise e volte para comentar se for
verdade.
Aliás, falando na mais terrível das desolações, Smaug rouba
a cena. Desde o primeiro filme era o que todo mundo queria ver e com certeza é
o monstro de CG que ganha o destaque do filme. Tanto que é feito uma enrolação
desnecessária com o personagem.Mesmo assim é muito divertido. Mas sente e aguarde porque você vai amargar
uma poltrona até ele dar as caras lá no final. Mas vale a pena, acredite.
Os anões estão muito bem obrigado e a única reclamação mesmo
é a falta de vida para alguns anões secundários. Bombur poderia ter sido muito
melhor aproveitado. Gandalf tem um papel decisório muito maior sendo que ele
descobre algo sobre o Necromante que qualquer um fã poderia supor. Mas sinto-me
desafiado a ver aonde os roteiristas irão ir com essa mini-saga paralela. O Bard, Luke Evans fez sua parte e até tem uma presença boa, embora discreta. Os efeitos de CG estão bem melhores que do primeiro, aliás é
praticamente isso a definição do 2º filme: Acertos que o tornam melhor que o
anterior, mas que carecem de algo que o torne GRANDE como o dragão. Smaug está bem construído com uma modelagem bem orgânica e com a participação brilhante de Benedict Cumberbatch, mas
ainda parece-me que os modeladores não sabem bem diferenciar orcs de trolls,
ainda mais que um clone do Azog é criado para dar um suspiro a mais para a raça
mais baixa da Terra-Média.
Quanto a Evangeline Lilly pode ficar tranquilo, ela contiinuará sendo
conhecida por Kate. Muito se temeu quando PJ anunciou que a atriz,
aposentada por livre vontade para o show bussiness, viveria um elfo fêmea e que ela seria um
personagem que não estaria no livro. Fato é que ela interpretou bem o que lhe
foi apresentado como papel, Tauriel, mas a criação em si é que não funcionou. Certamente
sua namorada irá achar legal e vibrará com a Malhação élfica, mas esse plot só
rouba cenas que poderiam ser desenvolvidas em personagens reais do livro. Lembro de ter lido uma entrevista que a atriz disse que era importante a personagem em um mundo onde só há homens bravos e heróicos, pois representaria a ala feminina. Ela que se diz fã deveria lembrar de Éowyn. Fora que por mais que sua personagem de fato seja uma guerreira de mão cheia com uma agilidade parecida com a de Legolas é nítido que sua função naquele mundinho não é exatamente essa. É muito mal construído a história toda dela. (meio SPOILER chegando) “Kate” se apaixona do nada pelo anão Kili e até, vejam vocês, acha o anão bonito. Enfim, para não estragar a surpresa fico por aqui nessa análise.
O filme é um colírio para os olhos cansados da mesmice hollywoodiana, mas pela expectativa gerada poderia render bem mais. Espero que em 2014 a terceira parte acerte algumas peças soltas da engrenagem e consiga deslançar em um final que possamos exclamar elogios ao sair do cinema. Será difícil sendo que Smaug não ficará até o fim. Mesmo assim aposto nas canções. Vai ser épico. Tem que ser...
TOMA RUMO GURI!!
aguardem um podcast e uma análise com spoilers.
Comentários